As oficinas “Ampliando Saberes” movimentam artesãos, artistas e bordadeiras de duas comunidades às margens do rio São Francisco – Ilha do Ferro no município de Pão de Açúcar, a 250 km de Maceió, e Entremontes, em Piranhas, distante 290 km da capital. De acordo com a artista visual Maria Amélia Vieira, que coordena as oficinas juntamente com o marido, o também artista visual Dalton Costa, as aulas ocorrem em dois dias da semana, “mas os alunos continuam a trabalhar nos outros dias”. “Eles estão muito empolgados e produzindo muito. Estão loucos para comercializar, mas pedi para que esperassem até a exposição no dia 30 de maio”, conta Amélia, que segue para o Sertão nesse final de semana.
O projeto é uma iniciativa do braço sertanejo do museu Coleção Karandash de Arte Popular e Contemporânea, com sede em Maceió e um barco atracado em Pão de Açúcar, que desde 2008 faz intervenções de arte educativa em povoados ribeirinhos entre o município pãodeaçucarense e Piranhas. Este ano, as oficinas estão sendo patrocinadas pelo edital “Patrimônio Cultural Brasileiro”, da Caixa Econômica Federal.
“A última aula da minha oficina é no sábado”, explica o escultor de Pão de Açúcar Petrônio Farias, vencedor em 2014 do troféu “Artesão do Ano”, outorgado em Maceió pelo museu de antropologia e folclore Théo Brandão. A aula do próximo sábado (2), de acordo com Farias, servirá para “dar acabamento” às peças que foram produzidas pelos estudantes. “Tenho uma média de 100 a 200 fotos de todo o processo da oficina, mostrando os alunos reinando com a madeira. Levei-os ao local onde recolhemos troncos para a produção de escultura e de objetos como bancos e cadeiras”, diz o artista, que começou a produzir aos dez anos de idade.
“Hoje tenho 47”, diz, lembrando que Fernando Rodrigues (1928-2009), o legendário escultor e marceneiro do povoado Ilha do Ferro, foi quem lhe ensinou a trabalhar “artisticamente” com a madeira. “Eu era uma criança muito humilde e fazia meus próprios brinquedos – carrinho de madeira, boi, carneiro e outros bichos de barro. Eu levava madeira para o seu Fernando e um dia de Semana Santa mostrei a ele as cabeças e mãos de ex-votos que eu fazia. Então ele comprou uma cabeça a R$ 10. Eu trabalhava na roça e aquilo para mim foi inesperado. Eu vi que podia ganhar dinheiro de outra forma, com a minha imaginação. Hoje a minha vida está bem melhor. Tenho um carrinho e uma moto e o meu sítio onde faço esses trabalhos.”
Maria Amélia observa que o local onde Petrônio Farias monitora a oficina de escultura em madeira, no sítio dele, fica à sombra de uma árvore. “Já tem uma produção imensa de bichos, bancos – a comunidade toda está envolvida.”
Farias diz que começou com uma turma de 37 alunos. “Mas alguns vão para um canto e outros continuam. Agora deve ter uns 18, e alguns deles se destacam – a gente vê que se tornarão excelentes artistas imaginários.” Imaginários? “Alguns se prendem ao artesanato e reproduzem a mesma peça várias vezes. Mas têm aqueles que vêm um pau e já imagina uma forma de bicho, um tamanduá, um jacaré, um tatu. Esses são os imaginários.”
Outros escultores atuam com a meninada da Ilha do Ferro em Pão de Açúcar. São eles Valmir Lima, Aberaldo e Antônio Sandes, Zé de Tertulina e Evânio.
Em Piranhas, a bordadeira Roseane Oliveira Lisboa ensina moças e mocinhas numa turma de 23 alunas. Sendo a comunidade de Entremontes conhecida (não somente em Alagoas) como refúgio de bordadeiras – com uma cooperativa, a Casa do Bordado, instalada na praça central do povoado –, dificilmente encontram-se por ali mulheres ou meninas que não bordem. “Umas três ou quatro não sabiam fazer nada”, reconhece Roseane, avisando que a situação agora, com a oficina de bordados que aconteceu durante todo o mês de abril, é bem diferente. “Já fazem bainha aberta e ficam ansiosas quando não tem aula”, diz, lembrando que “a maioria estuda à tarde”. “Por isso, a gente dá aula também no sábado, das 13h às 16h. E quando tem feriado, elas também querem estudar.”
De acordo com a mestra bordadeira de Entremontes, de 26 anos, a produção na Casa do Bordado também está em alta. “Estamos concentrando os trabalhos em conjuntos de bandeja, de lavabo e guardanapos. Mas os paninhos de drinques são campeões”, diz Roseane. Explicando: o “paninho de drinque” é feito em linho, com bordados de redendê (“geralmente bordamos uma florzinha”, diz a oficineira), que serve para envolver os copos de drinques. “O paninho serve para cobrir o copo e não molhar a mesa, substituindo aos guardanapos de papel”, ensina a artesã.