01/05/2015 12h09

Mestres se surpreendem com a produção de bordados e esculturas nas oficinas ‘Ampliando Saberes’

Ação do museu Coleção Karandash, em que artistas e artesãos ensinam técnicas de escultura em madeira e bordado à juventude de povoados ribeirinhos, supera as expectativas

Barcos estacionados à beira do Velho Chico na Ilha do Ferro

 

As oficinas “Ampliando Saberes” movimentam artesãos, artistas e bordadeiras de duas comunidades às margens do rio São Francisco – Ilha do Ferro no município de Pão de Açúcar, a 250 km de Maceió, e Entremontes, em Piranhas, distante 290 km da capital. De acordo com a artista visual Maria Amélia Vieira, que coordena as oficinas juntamente com o marido, o também artista visual Dalton Costa, as aulas ocorrem em dois dias da semana, “mas os alunos continuam a trabalhar nos outros dias”. “Eles estão muito empolgados e produzindo muito. Estão loucos para comercializar, mas pedi para que esperassem até a exposição no dia 30 de maio”, conta Amélia, que segue para o Sertão nesse final de semana.

O projeto é uma iniciativa do braço sertanejo do museu Coleção Karandash de Arte Popular e Contemporânea, com sede em Maceió e um barco atracado em Pão de Açúcar, que desde 2008 faz intervenções de arte educativa em povoados ribeirinhos entre o município pãodeaçucarense e Piranhas. Este ano, as oficinas estão sendo patrocinadas pelo edital “Patrimônio Cultural Brasileiro”, da Caixa Econômica Federal.

Lajeiro acumula reserva de água em plena região do sertão

“A última aula da minha oficina é no sábado”, explica o escultor de Pão de Açúcar Petrônio Farias, vencedor em 2014 do troféu “Artesão do Ano”, outorgado em Maceió pelo museu de antropologia e folclore Théo Brandão. A aula do próximo sábado (2), de acordo com Farias, servirá para “dar acabamento” às peças que foram produzidas pelos estudantes. “Tenho uma média de 100 a 200 fotos de todo o processo da oficina, mostrando os alunos reinando com a madeira. Levei-os ao local onde recolhemos troncos para a produção de escultura e de objetos como bancos e cadeiras”, diz o artista, que começou a produzir aos dez anos de idade.

Equipe do Museu Coleção Karandash se despedindo do sertão

“Hoje tenho 47”, diz, lembrando que Fernando Rodrigues (1928-2009), o legendário escultor e marceneiro do povoado Ilha do Ferro, foi quem lhe ensinou a trabalhar “artisticamente” com a madeira. “Eu era uma criança muito humilde e fazia meus próprios brinquedos – carrinho de madeira, boi, carneiro e outros bichos de barro. Eu levava madeira para o seu Fernando e um dia de Semana Santa mostrei a ele as cabeças e mãos de ex-votos que eu fazia. Então ele comprou uma cabeça a R$ 10. Eu trabalhava na roça e aquilo para mim foi inesperado. Eu vi que podia ganhar dinheiro de outra forma, com a minha imaginação. Hoje a minha vida está bem melhor. Tenho um carrinho e uma moto e o meu sítio onde faço esses trabalhos.”

Maria Amélia observa que o local onde Petrônio Farias monitora a oficina de escultura em madeira, no sítio dele, fica à sombra de uma árvore. “Já tem uma produção imensa de bichos, bancos – a comunidade toda está envolvida.”

Varal de bordado nas casas das artesãs em Entremontes, Piranhas

Farias diz que começou com uma turma de 37 alunos. “Mas alguns vão para um canto e outros continuam. Agora deve ter uns 18, e alguns deles se destacam – a gente vê que se tornarão excelentes artistas imaginários.” Imaginários? “Alguns se prendem ao artesanato e reproduzem a mesma peça várias vezes. Mas têm aqueles que vêm um pau e já imagina uma forma de bicho, um tamanduá, um jacaré, um tatu. Esses são os imaginários.”

Outros escultores atuam com a meninada da Ilha do Ferro em Pão de Açúcar. São eles Valmir Lima, Aberaldo e Antônio Sandes, Zé de Tertulina e Evânio.

Em Piranhas, a bordadeira Roseane Oliveira Lisboa ensina moças e mocinhas numa turma de 23 alunas. Sendo a comunidade de Entremontes conhecida (não somente em Alagoas) como refúgio de bordadeiras – com uma cooperativa, a Casa do Bordado, instalada na praça central do povoado –, dificilmente encontram-se por ali mulheres ou meninas que não bordem. “Umas três ou quatro não sabiam fazer nada”, reconhece Roseane, avisando que a situação agora, com a oficina de bordados que aconteceu durante todo o mês de abril, é bem diferente. “Já fazem bainha aberta e ficam ansiosas quando não tem aula”, diz, lembrando que “a maioria estuda à tarde”. “Por isso, a gente dá aula também no sábado, das 13h às 16h. E quando tem feriado, elas também querem estudar.”

De acordo com a mestra bordadeira de Entremontes, de 26 anos, a produção na Casa do Bordado também está em alta. “Estamos concentrando os trabalhos em conjuntos de bandeja, de lavabo e guardanapos. Mas os paninhos de drinques são campeões”, diz Roseane. Explicando: o “paninho de drinque” é feito em linho, com bordados de redendê (“geralmente bordamos uma florzinha”, diz a oficineira), que serve para envolver os copos de drinques. “O paninho serve para cobrir o copo e não molhar a mesa, substituindo aos guardanapos de papel”, ensina a artesã.

Dalton Costa visita o artesão Petrônio Farias, no meio da caatinga, onde conhece belas esculturas

 

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