30/01/2021 10h11

Pinheiro – Um apelo necessário e urgente

O acordo feito entre a Braskem e o Ministério Público nos deixou sem voz e sem vez

Eliana Cavalcanti

Eliana Cavalcanti *

Estou, constantemente, ouvindo perguntas ou comentários de maceioenses que ainda não atinaram para o grave desastre causado pela mineradora Braskem a cinco bairros de Maceió. Há o desconhecimento (e isso é incrível!); a acomodação (como se o fato estivesse acontecendo lá na Groelândia); e há a preocupação em sempre “sair bem nas fotos” e garantir as suas benesses. E, com isso, mais de 45 mil pessoas amargam uma situação catastrófica e cerca de 4 mil empreendedores (3.300 com CNPJs ativos e uns 600 informais) enfrentam uma batalha desumana. E é aí, nos empresários, que quero chegar.

Vocês sabiam que somente os moradores tiveram direito a R$ 1.000,00 de auxílio-moradia (quantia repassada mensalmente, tanto para quem morava numa casinha simples quanto para quem morava numa mansão), e nós, empresários, não estamos recebendo nem essa quantia irrisória? Aqui, um detalhe importante: os moradores não têm encontrado, nos bairros vizinhos, apartamentos ou casas para alugar por R$ 1.000,00, tendo de complementar o valor.

Nós que conseguimos mudar de bairro, estamos pagando R$ 15.000,00 R$ 10.000,00 ou R$ 7.000,00 de aluguel. O acordo feito entre a Braskem e o Ministério Público nos deixou sem voz e sem vez. Foi, repito, um acordo cruel e unilateral, pois só favoreceu à Braskem. Se estivessem pagando, pelo menos, nossos aluguéis (não os míseros R$ 1.000,00, é claro!), e nos ressarcindo do quanto gastamos para nos estabelecer em outro bairro, já seria uma ajuda. E os outros empresários, aqueles que não puderam sair do bairro? Esses, simplesmente, estão num bairro abandonado, arrodeados por escombros, num verdadeiro cenário de pós-guerra, sem clientela e sendo assaltados a todo momento. No meu caso, consegui sair porque vendi nosso carro e levantei um empréstimo no Banco do Nordeste para pagar em três anos. A Braskem nos deu R$ 10.000,00 para a mudança da empresa, e eu tive de gastar mais R$ 60.000,00. Por que tanta insensibilidade, se a empresa tem tanto dinheiro?

Os que passam pela nova sede ou veem as fotos que posto na mídia social, fazem comentários desta ordem: “Eliana é poderosa!”. Pensam que já recebi a minha indenização, comprei um novo espaço e que, portanto, “estou numa boa”. No entanto, o que era meu está no Pinheiro, e agora é da Braskem, desde que o acordo Braskem/Ministério Público me obrigou a assinar um Termo de Posse para a mineradora, tirando de mim aquele imóvel que construímos, eu meu marido, há quarenta anos, especialmente para ser uma escola de balé. Fomos expulsos de nossas casas, e não sabemos quanto nem quando iremos receber a nossa indenização. Hoje, tenho um compromisso de um aluguel que não estou conseguindo honrar.

Graças à Lei Aldir Blanc, concorri e fui agraciada com três prêmios que me fizeram pagar cinco meses de aluguéis atrasados e o 13º salário dos funcionários. Porém, já estou devendo cinco meses, novamente. Nenhuma empresa teve direito a auxílio-aluguel e, que eu saiba, nenhuma recebeu indenização até agora, com exceção do Centro Sportivo Alagoano (CSA). Quem souber de alguma outra empresa, por favor, me faça ciente. Estamos sofrendo há dois anos. Em junho passado, fecharam nossa escola com tijolos e, no dia 15 de outubro, tive um encontro on-line com a facilitadora da Braskem e o nosso advogado. Foram mais de duas horas de conversa. Desse encontro, já se passaram três meses. Isso nos leva a crer que querem nos exaurir ao extremo e, depois, oferecerem um valor aquém das nossas expectativas.

Por todo o serviço prestado à cultura de Alagoas, recebi, ao longo dos anos, prêmios, medalhas, comendas e títulos. Não vou perder meu tempo enumerando-os aqui. Para que servem, afinal? Comecei a trabalhar aos 15 anos, em Recife, não por necessidade, mas porque considerei o convite da minha professora de balé, para ensinar em sua escola, muito honroso. Trabalhei sempre os três horários e, muitas vezes, aos sábados e feriados. Nunca fui rica, mas sempre gozei de certo conforto. Não tenho vergonha de expor aqui a minha situação, pois aprendi que só deveria ter vergonha de roubar, matar, mentir, ser desonesta, corrupta ou tirar vantagem da desgraça dos outros. Estou viva e lutando para ter uma indenização justa. Só estou muito angustiada por ter perdido a minha segurança, a minha estabilidade financeira e, consequentemente, emocional. Para mim é motivo de grande desonra não poder estar em dia com meus compromissos. Só sabe o que é isso quem é honesto e respeita o outro.

O Governador do Estado, senhor Renan Calheiros Filho, e o ex-prefeito, senhor Rui Palmeira, calados estavam, calados permaneceram, imbatíveis nos seus descasos para com as vítimas dessa gigantesca tragédia, talvez a maior de todos os tempos, na sua singularidade. Vivemos numa terra sem dono. Estamos órfãos, confiando apenas na graça e misericórdia divinas.

Durante muito tempo, a nossa imprensa se manteve silenciosa. Uma pena, pois o desgaste poderia ter sido menor. Contudo, ela começa a falar e a esclarecer os fatos. A reportagem que a TV Record fez recentemente foi muito boa. Antes tarde do que nunca. Encerro com um apelo veemente: por favor, compartilhem, divulguem este texto. Peço por mim e por todos os empresários e empreendedores dos bairros afetados. Coloquem para si a nossa situação. A tragédia não só pertence a cinco bairros, mas é de toda Maceió. Quem sabe se mais bairros não serão afetados? A magnitude desta tragédia não tem fronteiras. Isto aqui é um grito de socorro!

 

* Bailarina, Professora e Proprietária da Escola de Dança Ballet Eliana Cavalcanti

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