04/10/2013 8h16

Velho Chico celebra 512 anos de descobrimento e conta com ações da Codevasf para revitalização

O berço do São Francisco fica na Serra da Canastra, no município de São Roque de Minas (MG)

Nascente do Velho Chico, no município de São Roque, em Minas Gerais

Bruno Santos/Codevasf

“Riacho do Navio corre pro Pajeú, o rio Pajeú vai despejar no São Francisco, o rio São Francisco vai bater no ‘mei’ do mar, o rio São Francisco vai bater no ‘mei’ do mar…”. Os versos da canção de Luiz Gonzaga são conhecidos e relatam um dos meandros percorridos pelo “rio da integração nacional”. Neste 4 de outubro, o “Velho Chico” comemora 512 anos, uma descoberta atribuída ao navegador genovês Américo Vespúcio, e segue resistente, levando vida a todos aqueles que se recostam às suas margens.

O berço do São Francisco fica na Serra da Canastra, no município de São Roque de Minas (MG). Da nascente, ele percorre cerca de 2.800 quilômetros até desaguar no Oceano Atlântico, passando por cinco estados; além de Minas Gerais, o rio banha as terras de Alagoas, Bahia, Pernambuco e Sergipe. Todo o vale sanfranciscano ocupa uma área aproximada de 620 mil quilômetros quadrados, incluindo 505 municípios, com uma população de cerca de 18,2 milhões de pessoas.

Com a sabedoria de quem muito já se aventurou nessas águas, o pescador Erenilton de Souza, o Leleco, não tem outro sentimento a demonstrar que não seja gratidão. “Ave Maria, pra mim, é tudo na vida! Porque água é vida e salva a gente!”. Com 53 anos, dos quais mais de 40 foram dedicados à pesca, o cidadão da “princesa” Juazeiro, na Bahia, é daqueles que levam a sério as tradições regionais – inclusive a crença em figuras lendárias como o Nego D’Água, caboclo virador de canoas e assustador de peixes. “Eu dizia que não acreditava e ficava zombando dele. Um dia, no ano de 1982, ele me botou pra correr. Fiquei assustado. Tem muitas histórias na região. Tinha pescador que até conversava com ele”, conta.

As lendas são uma das principais heranças culturais do rio. São personagens que, de tão peculiares, dão asas à imaginação daqueles que ouvem os relatos. Há quem garanta que não se trata apenas de história de pescador… Quem mora na região, provavelmente, já escutou falar da Mãe D’água, mulher de cabelos longos e verdes, com cauda de peixe, sempre vista em cima das pedras das cachoeiras. Sua voz melodiosa, assim dizem, costuma encantar pescadores, que, em troca, lhe oferecem presentes.

Outra lenda conhecida é a da Serpente D’Água, que, segundo os mais antigos, está presa a três fios de cabelo de Nossa Senhora das Grotas; no dia em que ela se libertar, vai inundar as cidades-irmãs Petrolina e Juazeiro. “As lendas, ainda hoje, estão vivas no imaginário do povo ribeirinho. Enquanto eu tiver vida, eu continuarei divulgando essa riqueza cultural”, garante a historiadora juazeirense Maria Izabel Muniz Figueiredo. Bebela, como é conhecida, é autora, entre outros, do livro “Lendas e mitos do rio São Francisco”. Nas salas de aula da região, as histórias são propagadas para as novas gerações, uma forma de preservar esse patrimônio.

As carrancas também compõem o leque de manifestações culturais do Velho Chico. Antigamente, elas eram colocadas na proa das barcas para dar sorte e afugentar os maus espíritos, o que ocorreu até meados da década de 1950. Hoje, as peças são fabricadas e comercializadas em mercados locais de artesanato. É o caso do Centro de Artes Ana das Carrancas, em Petrolina (PE), que faz alusão à memória da “dama do barro”, uma das artesãs de carrancas mais conhecidas no Brasil e no mundo, falecida em 2008. Segundo Maria da Cruz Santos, filha de Ana das Carrancas, o centro também promove capacitações. “Sempre que tem oportunidade, a gente busca repassar esse conhecimento. Ana colocava muito amor naquilo que fazia, e eu penso que essa arte precisa ser difundida”, explica.

Revitalizando o Velho Chico

“Seu” Toinho Pescador, natural de Penedo (AL), tem a história de sua vida bastante ligada ao rio São Francisco. Aos 81 anos, ele se emociona ao falar daquele que considera um “pai”: “Posso dizer que criei meus filhos pescando. Nós não tínhamos ajuda. Quem me deu todo o sustento foi o rio. Quem foi o verdadeiro pai foi o São Francisco”.

Ao longo de décadas, o pescador acompanhou de perto a trajetória do Velho Chico e lamenta as “torturas” sofridas pelo rio, resultantes de ações como o desmatamento das margens, a poluição e a pesca predatória. “Tenho criado poesia, música e participado de diversos eventos, sempre com essa esperança de que a gente vai melhorar um pouco. Vamos lutar pela revitalização, o rio merece”, reforça.

Para fazer face a essa realidade, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), empresa pública vinculada ao Ministério da Integração Nacional, tem empreendido uma série de ações ambientais que têm como objetivo o desenvolvimento e a revitalização do rio.

“A história da Codevasf, que em 2014 comemora 40 anos, se confunde com a própria história do rio São Francisco. Antes de sua criação, houve todo um trabalho empreendido pela Comissão do Vale do São Francisco e Suvale (Superintendência do Vale do São Francisco). Não tenho dúvida de que todos os municípios que compõem a bacia foram, de alguma forma, beneficiados com o trabalho em prol do desenvolvimento da região, sobretudo, através dos projetos de irrigação. Hoje temos também importantes ações na área de revitalização para garantir que o rio seja sustentável e que a gente possa deixá-lo para as próximas gerações”, afirma o presidente da Codevasf, Elmo Vaz.

Mais de R$ 1,3 bilhão estão sendo investidos pela Companhia em coleta, tratamento e destinação de resíduos sólidos, controle de processos erosivos e esgotamento sanitário. Os recursos são do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para o período 2011-2014, e as ações fazem parte do Programa de Revitalização das Bacias dos Rios São Francisco e Parnaíba, coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). Os estados beneficiados são: Alagoas, Bahia, Maranhão, Minas Gerais, Pernambuco, Piauí e Sergipe.

Os reflexos dessas iniciativas, em geral, aparecem em médio e longo prazo. Um sistema de esgotamento sanitário, por exemplo, reduz os recursos aplicados no tratamento de doenças, uma vez que grande parte delas está relacionada à falta de solução adequada para esse problema. Ao mesmo tempo, reduz o despejo de esgoto direto no rio, melhora as condições sanitárias locais e contribui para a conservação dos recursos naturais e a eliminação de focos de poluição.

Mais de 200 municípios estão sendo beneficiados com os sistemas de esgotamento sanitário implantados pela Codevasf. As obras atendem a zonas urbanas de municípios com população de até 50 mil habitantes e, em sua maioria, com prioridade para as localidades situadas na calha do rio São Francisco.

Outra importante ação ambiental é a recuperação e o controle de processos erosivos, que contam com diferentes métodos: revegetação; cercamento e proteção de nascentes, matas ciliares e topos de morro; construção de barraginhas e terraços; readequação de estradas vicinais e estabilização de margens, entre outras.

A principal finalidade desse trabalho é a captação e acumulação de águas pluviais, aumentando sua infiltração no solo e, desta forma, promovendo o abastecimento do lençol freático e aumento da disponibilidade hídrica na região – além de reduzir o escoamento superficial, que evita o arraste de sedimentos, o empobrecimento do solo e o assoreamento dos cursos d’água.

Outra iniciativa prioritária na área ambiental é a implantação de sistemas públicos de coleta, tratamento e destinação final de resíduos sólidos, com investimentos previstos de R$ 52 milhões no período 2011-2014. Para revitalizar as bacias, são instalados aterros sanitários e elaborados projetos para manejo e disposição adequadas de resíduos, encerramento de lixões e aquisição de equipamentos para operação adequada de aterros. Assim, evita-se que os rios sejam poluídos e, consequentemente, aumenta-se a qualidade da água, por meio da erradicação de focos poluidores.

Os peixamentos realizados pela Companhia também contribuem para a revitalização do Velho Chico. Cerca de sete milhões de alevinos de espécies nativas deverão ser soltos no rio em 2013, por meio de uma centena de peixamentos em pontos diferentes da bacia. Essa ação tem como objetivo a recomposição da ictiofauna de rios, lagoas e grandes reservatórios hídricos na bacia. Além da revitalização desses ambientes, busca a sustentabilidade da atividade pesqueira com o aumento da abundância de peixes e a diminuição dos efeitos dos impactos ambientais sobre grande parte das espécies mais visadas. Também pretende recuperar peixes que encontram-se ameaçados de extinção.

Em 2012, foram produzidos cerca de 11,8 milhões de alevinos nos sete Centros Integrados de Recursos Pesqueiros e Aquicultura, administrados e operados pela Codevasf. No mesmo ano, foram realizados 33 peixamentos. Para 2013, a meta dos centros é ampliar a produção para 15 milhões de alevinos, sendo que 7 milhões, espécies nativas do Velho Chico, serão lançados no rio em 100 operações de soltura de peixes.

 

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